Reportando-se ao âmbito de uma Tese de Doutoramento sobre a morte numa sociedade em rede, a comunicação aborda os obituários digitais, especificamente a produção de reacções e comentários, por parte de utilizadores, em memoriais online de falecidos. Procura-se compreender as características deste tipo de discurso, as dinâmicas relacionais entre utilizadores e o falecido e família enlutada, e que influência este discurso online tem no conceito mais alargado de memorialização. A metodologia utilizada parte da Análise do Discurso, e procura, por um lado, identificar aspectos da prática discursiva, como o número e tipo de reacções a uma publicação, o número de comentários e de interacções (e.g., partilhas, diálogo entre utilizadores), ou ainda a utilização de memes e emojis neste tipo de reacções; e, por outro lado, discorrer sobre os significados presentes no discurso, compreendendo, por exemplo, como o luto e a morte são representados e comunicados pelos indivíduos, e como os comentários ajudam a construir significado em relação ao morto, à sua vida e personalidade. Especificamente, são analisadas i) cinco páginas de Facebook de funerárias locais, que publicam recorrentemente obituários e permitem, nas publicações dos mesmos, reacções por parte dos utilizadores; e ii) o website Até Sempre, espaço centralizado de obituários e memoriais, que incentiva igualmente reacções por parte de utilizadores. Ambos possibilitam a análise de obituários em localidades específicas, sendo que os utilizadores que comentam tendem a conhecer o falecido por via do contacto físico na comunidade. Reportando-se ao mês de Setembro de 2022, são analisadas cerca de 50 publicações de óbitos. Da análise, ainda em desenvolvimento, parecem surgir algumas conclusões, como a propensão para uma “linguagem digital” dos utilizadores, em especial com o uso algo frequente de emojis e de memes para expressar as condolências; a tendência para a linguagem surgir muitas vezes informal e mesmo com um uso incorrecto da língua portuguesa, que contrasta com a formalidade presente noutros espaços similares; a recorrência com que alguns utilizadores em específico, ligados à página de Facebook da funerária, acabam por expressar as suas condolências independentemente de quem morre (normalmente produzindo o mesmo comentário em todas as publicações), apontando para um carácter anónimo e mais intermediado deste tipo de plataformas, apesar do seu carácter comunitário; ou ainda a produção de significados sociais relativamente à vida do falecido através do relato de uma história pessoal ou de alusões à profissão e elogios à personalidade, sendo isso produzido inteiramente pelos utilizadores. Estas tendências promovem, pois, a que determinadas expectativas comunicacionais possam vir a ser reconfiguradas, nomeadamente no que respeita ao papel do digital no contexto da comunidade e no que concerne a conceitos como luto e memorialização.

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