Em agosto de 2019, incêndios de grandes proporções, provocados por produtores rurais locais, atingiram a região amazónica brasileira. Segundo o INPE, entre os dias 10 e 11 de agosto foram contabilizados 1.457 focos de incêndio, em comparação com 101 focos contabilizados no dia anterior (Pontes, 2020). O nome deste evento foi cunhado pelo jornalista Adécio Piran em reportagem ao jornal Folha do Progresso (Piran, 2019) e em seguida popularizado pelo também jornalista Fabiano Maisonnave, no jornal Folha de São Paulo (Maisonnave, 2019). A partir da veiculação do “Dia do Fogo” nos dois jornais impressos, observa-se o desenvolver do evento em diferentes medias, culminando na #PrayForAmazonia, que se tornou o assunto mais comentado no Twitter no mundo (BBC News, 2019), passando a figurar também nas manchetes dos meios de comunicação tradicionais, tais como as TVs, os jornais (impressos e online) e as rádios. O evento passou ainda a ser discutido internacionalmente em conferências intergovernamentais e nos pronunciamentos oficiais de diferentes chefes de Estado. À luz da discussão teórica do conceito de “evento mediático”, que aqui abordamos a partir da operacionalização por Hepp e Couldry (2018), num contexto que chamam de “mediatização profunda” e que inclui os fenômenos contemporâneos de datificação e algoritmização da comunicação (p.116), buscamos desenvolver como a performance discursiva populista neoliberal e militarista do presidente Jair Bolsonaro em seu Twitter, estruturada na divisão da sociedade entre grupos antagônicos e no estabelecimento de conflitos, responde à figuração do evento socioambiental do “Dia do Fogo” num evento mediático, respondendo e influenciando as relações de poder que perpassam o acontecimento. Assim, a partir da Análise Crítica do Discurso (Van Dijk, 1983), precedida de uma Análise Temática de Conteúdo (Bardin, 1976), tendo em vista as publicações realizadas no Twitter de Jair Bolsonaro entre os dias 04 de julho e 16 de setembro de 2019, compreendemos que o “Dia do Fogo” se trata de um evento que revela e realça os conflitos socioambientais prementes na região, ecoando a revisão do conceito de evento mediático por Couldry (2003): “eventos mediáticos também podem, por sua escala, oferecer oportunidades para que os conflitos subjacentes sejam expressos ou negociados” (p. 71).

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