Com esta comunicação pretende-se identificar, sistematizar e problematizar algumas tendências de transformação logística no sector das plataformas de entregas, tendo como referência temporal o período da pandemia e a sua expressão territorial na Área Metropolitana de Lisboa. A partir da combinação de recolha de informação secundária, etnografia digital em páginas de plataformas e sítios web relacionados com o sector, e uma revisão e discussão teórica no cruzamento das plataformas digitais e dos estudos de logística no espaço urbano contemporâneo, pretende-se atingir dois grandes objetivos. Em primeiro lugar, identificar as dinâmicas de transformação mais diretamente associadas à pandemia da Covid-19 e às mudanças a que esta obrigou, com destaque para aquelas diretamente associadas ao confinamento e a práticas de distanciamento social, as quais tiveram efeitos ao nível da organização e modelo de negócio das plataformas. Em segundo lugar, pretende-se sistematizar e problematizar algumas das principais alterações de organização e intermediação logística em emergência neste sector durante o período pandémico, mesmo que não sejam diretamente causadas pela pandemia, embora se defenda que tenham encontrado neste período um contexto favorável para a introdução e aceleração de determinadas mudanças – como é o caso da introdução de novos conceitos de micro-logística ou o acentuar de determinadas estratégias de datafication associadas às plataformas. Antes da exploração desses dois grandes objetivos, e num primeiro passo, pretende-se apresentar uma contextualização do sector das plataformas de entregas em Lisboa. Em particular, pretende-se apresentar sumariamente o seu processo de implantação e disseminação na Área Metropolitana de Lisboa, e contextualizar tal processo numa tensão entre determinadas formas de experimentação urbana que as mesmas têm vindo a realizar no território, e a sua relação com a atuação, ou inação, da administração local. Posteriormente, apresenta-se uma breve revisão e discussão teórica focada no cruzamento entre estudos de logística e plataformas digitais, centrando-se tal discussão no âmbito dos seus efeitos no espaço urbano e em algumas tendências recentes de reorganização logísticas das plataformas de entregas. Entre outros pontos, pretende-se discutir a forma como as plataformas se associam a fenómenos de experimentação urbana (Leonardi e Pirina, 2020); como as plataformas podem ser enquadradas enquanto agentes que induzem “arranjos espaciais flexíveis” que atuam numa lógica relacional e de reorganização de outras operações urbanas (Richardson, 2020); a dinâmica processual da própria organização das plataformas de entregas (van Doorn et al, 2021); a forma como a dimensão do movimento e da distribuição emerge enquanto uma questão logística por excelência no caso das plataformas de entregas (Altenried, 2020); e o salientar do carácter conjuntural das suas geografias que simultaneamente as incorpora e desincorpora dos contextos territoriais onde se inserem (Graham, 2020). Num âmbito mais empírico, pretende-se apresentar e problematizar algumas mudanças no sector que sejam mais diretamente associáveis entre a pandemia e os seus efeitos no sector das plataformas de entregas. Em particular, pretende-se apresentar alguns processos de reestruturação e plataformização do sector da restauração que foram induzidos no período da pandemia e que contribuíram para um acentuar do peso das plataformas de entregas. Um acentuar que, defende-se, não só contribuiu para um processo de crescimento e afirmação das plataformas de entregas no âmbito do comércio/restauração e nas práticas e ritmos sociais do espaço urbano e da sociedade em geral, como contribuíram para sedimentar o sector das entregas no ecossistema/modelo de negócio das plataformas digitais em geral – como se atesta, por exemplo, num crescimento do volume de negócios das entregas que ocorreu em sentido contrário ao verificado no sector do transporte de passageiros/ridesharing, e que se observou de forma paradigmática na Uber (entre os seus serviços de entregas e o serviço de transporte de passageiros). Ainda relativamente a este recorte empírico referente à AML, pretende-se apresentar, sistematizar e problematizar três grandes tendências recentes de transformação ao nível da organização e intermediação logística no sector das plataformas de entregas, as quais encontraram no período pandémico um contexto favorável para a sua disseminação, ainda que não sejam diretamente resultado do mesmo. Mais especificamente, pretende-se: a) discutir uma acentuação da aposta na micro-logística neste sector, como atestam o alargamento da oferta de distribuição disponibilizadas pelas plataformas (ao nível de serviços e produtos, de que são exemplos extremos os protocolos que algumas destas plataformas têm estabelecido com empresas privadas na área da saúde, seja para a realização de testes PCR ao domicílio ou para o serviço de consultas médicas ao domicílio), bem como a introdução e disseminação de conceitos como as Dark Kitchens e Dark Stores; b) apresentar e problematizar a emergência de novos conceitos de plataformas de entregas, com destaque para as plataformas de “ultrafast-delivery” (de que é exemplo a GETIR) ou a emergência de algumas plataformas com conceitos mais especializados/diferenciados (por exemplo, plataformas que se pretendem distinguir pelas suas preocupações ambientais ou outros conceitos logísticos/organizacionais); c) problematizar, através do exemplo do Centro de Excelência da Uber em Lisboa e seu desenvolvimento recente, a forma como tais plataformas têm utilizado o espaço urbano e as práticas de comércio digitalmente mediado enquanto formas de experimentação para a introdução e teste de novos serviços e produtos, de onde as questões do uso dos dados e algoritmos adquire particular relevância. Por último, e retomando a discussão teórica apresentada, pretende-se sintetizar e fazer sentido de tais transformações no âmbito de problemáticas recentes no cruzamento entre estudos de logística e plataformas digitais, enquadrando transformações em debates como a relação entre experimentação urbana, reorganização logística das plataformas e da cidade, ou as possibilidades de um seu efetivo planeamento.

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