Em agosto de 1963, a ditadura portuguesa promove em Lisboa uma grandiosa manifestação de apoio à sua própria política colonial. Apesar da larga difusão radiofónica e televisiva do evento, o regime empenha-se em levá-lo também às salas de cinema, através de dois jornais de actualidades (Imagens de Portugal e Visor) e, sobretudo, de um documentário, A Razão de Portugal. O SNI distribuiu directamente esta película, numa operação que abrange quase 3 centenas de salas comerciais, associativas e institucionais em todo o país, assim como várias representações e comunidades portuguesas no estrangeiro. A troca de correspondência entre o SNI e esta diversidade de exibidores permite-nos identificar as classes populares, urbanas e rurais, como destinatários principais do filme, detectar resistências mais ou menos veladas e adesões mais ou menos interessadas à sua exibição, aprender sobre a exibição cinematográfica não comercial da época e sobre a relação com o cinema nos públicos em causa, e perceber como a própria efemeridade do filme se jogou nas decisões arquivísticas do SNI ao terminar a campanha de exibição. Entre as imagens nulas ou redundantes de um filme efémero e o seu rasto no arquivo escrito, é possível interrogar contextos, usos e vivências relevantes do cinema em Portugal.

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