Publicação em atas de evento científico
Trabalho “(pouco) doce”: Análise de riscos de um pasteleiro e proposta de intervenção
Ana Ferrinho (Ferrinho, A.); Maria Carreira (Carreira, M.); Beatriz Lucas (Lucas, B.); André Wang (Wang, A.); João Veiga (Veiga, J.); Inês C. Sousa (Sousa, I. C.);
Proceedings CICOT2023: 6th International Congress on Working Conditions
Ano (publicação definitiva)
2023
Língua
Português
País
Portugal
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(Última verificação: 2024-12-16 23:26)

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Abstract/Resumo
Enquadramento e principais objetivos do trabalho: A Indústria Agroalimentar, maioritariamente constituída por micro, pequenas e médias empresas, é a maior indústria portuguesa, e inclui a indústria da panificação (Lourenço et al., 2019). Neste sentido, tem existido uma grande preocupação em investigar a segurança e saúde dos trabalhadores deste setor (e.g., Alexopoulos et al., 2009; Santos & Almeida, 2016). No entanto, um dos principais riscos identificados por Lourenço et al. (2019) é a ausência de uma avaliação de riscos por posto de trabalho, nomeadamente ao nível do ruído, ambiente térmico e vibrações. Procurando responder a este apelo de investigação, o objetivo deste trabalho é analisar os riscos do posto de trabalho de um operador de fábrica de produtos de padaria e pastelaria, localizada no distrito de Lisboa. Abordagem teórico-metodológica preconizada: A análise de riscos de um único posto de trabalho enquadra-se na ergonomia da atividade. Esta pretende enfatizar a relação entre um indivíduo específico, as suas características e necessidades, e o seu trabalho, as características da organização, a forma de organização do trabalho e o ambiente no qual as tarefas são desempenhadas. Assim, neste trabalho foram utilizadas três metodologias de recolha de dados: análise documental, observação e entrevista. A análise documental incluiu o “Manual de utilização da ferramenta de avaliação de riscos em empresas de produtos de padaria/pastelaria” desenvolvido no âmbito do Projeto +Agro – Qualificação organizacional, energética e de segurança e saúde no trabalho da indústria agroalimentar (2018), assim como as Listas de Verificação disponibilizadas pela Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT, 2023). A análise documental permitiu a elaboração da grelha de observação. A observação teve uma duração aproximada de 3 horas e contou com três observadores diferentes: dois realizaram uma observação participante (i.e., com interação com o trabalhador, colocando questões sempre que necessário), recorrendo à utilização de uma grelha de observação construída previamente, e um realizou uma observação não-participante livre (i.e., sem interação com o trabalhador e com registo livre de comportamentos). Após análise dos dados provenientes da observação, foi realizada uma entrevista semiestruturada com o objetivo de obter a vivência profissional e pessoal concreta do trabalhador, tendo sido preparado um conjunto de questões a colocar, mas com flexibilidade para o surgimento de novas questões que permitissem aprofundar os tópicos em estudo. A entrevista teve a duração de cerca de 47 minutos. O trabalhador é do sexo masculino, tem 49 anos e concluiu o 12.º ano. Nasceu no Brasil, tendo sido este o país onde adquiriu os conhecimentos na sua área de trabalho e onde concluiu a sua formação como pizzaiolo. Também no Brasil adquiriu conhecimentos e formação na área de primeiros socorros e procedimentos de segurança e evacuação. Atualmente, o trabalhador desempenha as suas funções em regime diurno e horário fixo, contando com a existência de um contrato full-time (8 horas diárias), acrescido de um contrato de trabalho part-time (3 horas diárias). Apresentação dos principais resultados: A análise de riscos resultou na identificação de 20 riscos, assim como os respetivos níveis de risco. Neste resumo serão apresentados apenas três riscos, possíveis consequências e respetivas sugestões de intervenção, escolhidos com base no nível de urgência da intervenção. O risco de ruído tem origem no barulho constante do gerador da ventilação da fábrica, que, medido através de uma aplicação para o telemóvel, apresentou um valor de 87 decibéis. Durante a entrevista, o trabalhador mencionou que este ruído era incómodo e que, apesar de achar importante, a empresa não disponibiliza nenhum equipamento de proteção auditiva. Esta situação poderá contribuir, a curto prazo, para o aumento da fadiga, e a longo prazo, considerando o nível e a frequência elevados, poderá afetar o sistema nervoso e, em casos extremos, sujeitar o trabalhador a traumas auditivos e surdez. Considerando as características do processo produtivo da indústria da panificação, o trabalhador encontra-se exposto a ambientes térmicos quentes e frios. Embora exista um sistema de ventilação na fábrica, foi identificado o risco térmico associado ao calor, proveniente dos diferentes fornos e fogões, o que poderá desencadear, a curto prazo, uma maior dificuldade de concentração, desgaste e fadiga. A longo prazo, e em situações extremas, pode ainda originar cefaleias, taquicardia ou astenia. Por outro lado, foi ainda identificado o risco térmico associado ao frio, pela necessidade de deslocação entre as câmaras de congelação/refrigeração e o exterior. Verificou-se que, embora esteja disponível, o trabalhador não utiliza o equipamento de proteção (i.e., colete térmico), que permitiria minimizar as potenciais consequências negativas associadas a esta situação (e.g., vasoconstrição sanguínea, diminuição da destreza manual, frieiras). O risco de queda ao mesmo nível tem origem na existência de pequenos desníveis no pavimento, bem como no mau estado desse pavimento, já que as cavidades existentes no piso acumulam água quando este é lavado. As rampas com inclinações acentuadas e escorregadias no acesso às câmaras de refrigeração e de congelação constituem também fatores de risco. A situação da rampa escorregadia foi ainda salientada durante a entrevista, tendo sido referido o caso de um acidente grave. Verificou-se que os trabalhadores colocam pedaços de cartão para evitar escorregar na água acumulada nas cavidades do pavimento (e.g., junto ao lavatório das mãos), o que representa o risco de tropeçar nos mesmos. Esta situação é ainda agravada pela presença de ingredientes de confeção dos produtos no pavimento (e.g., farinha). A desorganização do espaço acentua a probabilidade de risco de queda ao mesmo nível, pela acrescida dificuldade de movimentação e transporte de materiais pesados devido a obstáculos no trajeto. Discussão e principais conclusões: A proposta de intervenção foi elaborada com o objetivo de minimizar os riscos identificados e as suas potenciais consequências. Relativamente ao risco de ruído, é necessário implementar práticas preventivas para estas situações tais como a adoção de equipamentos de proteção individuais (EPIs) como protetores auditivos, implementação de sinalização de segurança e restrição no acesso aos locais identificados. Considerando que a maior fonte de ruído é o gerador de ventilação da fábrica, recomenda-se o isolamento desta área ruidosa das não ruidosas, construindo, por exemplo, uma divisória ou encapsulando o gerador. Para minimizar o risco térmico associado ao calor, propõe-se a colocação de proteções nas superfícies que irradiem calor, o fornecimento de EPIs específicos (e.g., luvas térmicas, avental térmico) para utilização na abertura do forno, e ainda a introdução de pausas e/ou alternância de tarefas de modo a evitar a exposição longa a esta situação. Para o risco térmico associado ao frio, recomenda-se a aquisição de coletes térmicos e a existência de um cabide instalado na lateral da câmara de refrigeração, de modo a facilitar o acesso ao mesmo e relembrar a necessidade da sua utilização. Cabral (2011) define que os requisitos mínimos de segurança no local de trabalho incluem pavimentos fixos, estáveis, antiderrapantes, sem inclinações perigosas, saliências e cavidades, com sinalização adequada, e ainda a prevenção de riscos associados a eventual circulação de veículos. Assim, para reduzir o risco de queda ao mesmo nível, sugere-se a total substituição do pavimento, uma vez que certas zonas já não são antiderrapantes e as cavidades existentes acumulam água. Contudo, reconhecendo o elevado valor associado a esta medida e considerando o facto de a fábrica funcionar em regime contínuo, recomenda-se que, com a maior urgência, seja colocada massa para tapar as cavidades e aplicar um spray antiderrapante nessas áreas. Sugere-se a alteração da rampa de acesso às câmaras de refrigeração para uma inclinação menos acentuada e antiderrapante. Recomenda-se também a colocação de sinalética de segurança (e.g., piso escorregadio). Por último, a organização deve disponibilizar o calçado apropriado e antiderrapante como EPIs aos seus trabalhadores. A par destas medidas, deve existir uma ação de sensibilização para a importância da limpeza e organização e do espaço de trabalho para os trabalhadores da fábrica. Este trabalho assume-se assim como um importante contributo para a segurança e saúde da indústria da panificação, ao identificar os riscos a que os trabalhadores podem estar sujeitos e apresentar uma proposta que pretende garantir a sua integridade física, psíquica e social.
Agradecimentos/Acknowledgements
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Palavras-chave
Análise de riscos,Pasteleiro,Proposta de intervenção
  • Economia e Gestão - Ciências Sociais

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